sexta-feira, 23 de abril de 2010
Ciro cansa de apanhar na intimidade e solta a língua
Lula agiu com método. Primeiro, borrifou na atmosfera a tese do plebiscito. Depois, isolou o quarteirão de Ciro Gomes.
Afastou da vizinhança legendas como PDT e PCdoB, abringando-as no interior da coligação de Dilma Rousseff.
Em meticulosa operação, Lula empurrou o pseudoaliado do Ceará para São Paulo. Quando parecia domado, Ciro tornou-se arredio.
Lula, então, passou a tratá-lo como candidato tóxico. Incumbiu o amigo Eduardo Campos de apagar o pavio de Ciro.
Marcou-se o dia: terça-feira (27). Armou-se o palco: Executiva do PSB. Mas deu chabu. Ciro explodiu antes da data.
O ex-presidenciável mandou tudo para os ares numa entrevista ao experimentado repórter Eduardo Oineque.
Os estilhaços foram bem distribuídos. A maioria foi à testa de Lula: “Ele não é Deus”.
“Lula está navegando na maionese. Ele está se sentindo o Todo-Poderoso e acha que vai batizar Dilma presidente da República. Pior: ninguém chega para ele e diz ‘Presidente, tenha calma’."
No melhor estilo Marta ‘Relaxa e Goza’ Suplicy, Ciro conformou-se:
"Tiraram de mim o direito de ser candidato. Mas quer saber? Relaxei. Eles não querem que eu seja candidato? Querem apoiar a Dilma? Que apoiem a Dilma...”
“...Estou como a Tereza Batista cansada de guerra. Acompanho o partido. Não vou confrontar o Lula. Não vou confrontar a Dilma".
Em seguida, pôs-se a confrontar: “Minha sensação agora é que o Serra vai ganhar esta eleição...”
“...Dilma é melhor do que o Serra como pessoa. Mas o Serra é mais preparado, mais legítimo, mais capaz...”
“...Mais capaz inclusive de trair o conservadorismo e enfrentar a crise que conheceremos em um ou dois anos”.
Desenhou o desastre: "Em 2011 ou 2012, o Brasil vai enfrentar uma crise fiscal, uma crise cambial...”
“...Como estamos numa fase econômica e aparentemente boa, a discussão fica escondida. Mas precisa ser feita”.
Indicou ao eleitor um caminho: "Como o PT, apoiado pelo PMDB, vai conseguir enfrentar esta crise? Dilma não aguenta. Serra tem mais chances de conseguir”.
Alvejou quem o alveja: "Sabe os aloprados do PT que tentaram comprar um dossiê contra os tucanos em 2006? Veremos algo assim de novo. Vai ser uma merda”.
Empurrou quem o empurra: “Não me peçam para ir à televisão declarar o meu voto, que eu não vou. Sei lá. Vai ver viajo, vou virar intelectual. Vou fazer outra coisa".
Falou de si mesmo como quem já enxerga o pretérito passando: “Não me importava de ser um candidato com 2%, 5%, 10% das intenções de voto...”
“...Acho que minha presença nos debates e nos programas de televisão poderia provocar uma discussão no país, uma discussão sobre o futuro do Brasil”.
O Ciro Gomes das últimas semanas não era Ciro Gomes. O Ciro autêntico, o genuíno, o legítimo será conhecido agora.
Ao abandonar Ciro na beira da estrada, Lula imaginou que o ex-ministro fosse se dedicar a lamber rapadura. Queria dele humildade.
Mas a humildade é defeito que Ciro prefere se abster de cultivar. De resto, a humilhação olhou para a cara do sertanejo no espelho e aconselhou:
“Seja arrogante! Erga a cabeça! Suba pelas paredes!”
Lula parece não ter se dado conta de que Ciro Gomes era Ciro Gomes.
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