Manaus - Com a banca localizada logo na entrada do pavilhão de hortifrutigranjeiros, de frente para a Avenida Manaus Moderna, o vendedor de queijo Raimundo Nonato mal tinha tempo de embalar os pedados do laticínio, pedidos a todo o instante por novos e antigos clientes que visitavam o Mercado Adolpho Lisboa, reaberto oficialmente na noite de ontem. Em apenas duas horas de funcionamento, o comerciante já havia vendido quase todo o estoque levado para a inauguração.
“Faz tempo que não vemos um movimento assim, mesmo antes de ele fechar para a reforma. Já vendi hoje o que demorava quatro dias para vender na feira improvisada”, comemora.
Até o meio-dia de hoje, o local já havia recebido aproximadamente 10 mil pessoas e a estimativa da Secretaria de Feiras, Mercados, Produção e Abastecimento (Sempab), que administra o espaço, é de que, até o final do dia, outras 10 mil ainda passem pelo lugar, reinaugurado a meia-noite de quarta-feira.
No primeiro dia de funcionamento os Pavilhões de Artesanato e de Hortifrutigranjeiros estavam com cerca de metade das bancas abertas. Mas muitos comerciantes ainda realizavam ajustes em seus boxes e permaneceram fechados. Nos Pavilhões da Carne e do Peixe, os visitantes apenas puderam observar os novos aparatos de exposição e refrigeração dos produtos, ainda tinindo de brilhantes. Nenhum comerciante, no entanto, havia ocupado os postos.
Mas isso não incomodou o público, já que muitos entravam no local pela primeira vez. Este era o caso da pequena Ana Vitória Pinheiro, de dez anos. “Ele é tão lindo quanto eu imaginava. Estou aprendendo muitas coisas sobre a nossa historia”, disse.
Para o empresário João Antônio Barroso, que costumava tomar café da manhã no mercado quando era jovem, a restauração do local servirá também para recuperar a identidade do manauara. “Quando você viaja para algum lugar um dos pontos principais é sempre o mercado central. Pois é onde você encontra os ingredientes, as comidas, os itens que fazem a identidade de cada povo. E a gente tinha perdido isso. Agora nossa cultura está aqui, para ser mostrada de novo”, afirma.
O paranaense de Maringá, Rodrigo Morais, estava na cidade a trabalho e aproveitou a abertura dos portões para conhecer o espaço, na companhia de um colega de profissão nascido em Manaus, Alexandre Costa. “Ter um mercado como esse é muito importante para o turismo. Para a gente que é de fora, é uma oportunidade de conhecer a cultura que foi ficando para trás”, disse Morais.
De acordo com Alexandre, quando o mercado estava localizado no ponto provisório, não havia possibilidade de levar colegas e amigos de outros estados para conhecer os produtos da região, devido a sujeira e estrutura precária do lugar. “Não que eu tenha alguma coisa contra o Centro, até porque eu fazia minha feira lá. Mas faltava esta beleza, esta arquitetura, esta simplicidade, de corredores largos e, principalmente, limpeza, para que o passeio fosse agradável”, conta.
Para a comerciante Sheila Lima, que conta ter crescido entre os corredores do Adolpho Lisboa, o momento era de contemplação e alegria. “O Centro vai voltar a ser o que era antes e Manaus acaba de ganhar um lindo cartão postal”.
Apesar de toda a novidade e da disposição de lixeiras em pontos estratégicos, infelizmente, alguns visitantes deixaram sua marca na reinauguração do espaço abandonando latas, copos e garrafas plásticas nos muros e no chão recém restaurados.
Comerciantes
O mercado tem espaço para abrigar 182 permissionários, e quase todos permaneciam no espaço improvisado ao lado do Adolpho Lisboa há pelos menos sete anos.
A vendedora de cuias e itens de palha, Maria Rosa Brito, trabalha no mercado há 35 anos. Sentada em uma cadeira de plástico, ao lado de um balaio improvisado com os produtos, a comerciante conta que a espera pela reinuaguração foi árdua, mas que valeu a pena. “Para mim o período que ficamos no espaço provisório foi terrível, eu tive que ficar lá para garantir meu espaço aqui. Mas as vendas eram péssimas. A expectativa é que, com este novo espaço, a gente consiga recuperar o tempo perdido, ano que vem vai ‘bombar”, comemora.
A proprietária de uma banca de sabonetes, ervas e produtos naturais, Nora Garcia, que tem um ponto no local há 30 anos, conta que apenas conseguiu se manter graças a clientes fixos. Mas que se dependesse do antigo espaço, a loja teria fechado. Ele lembra dos momentos de dificuldade que passou durante a espera. “Primeiro ficávamos em boxes com cobertura de lona, que eram muito ruins, pois quando chovia caía água dentro. Daí o mercado fechou para reforma e fomos colocados em boxes de madeira, que depois pegaram fogo. Então fomos mandados para o outro espaço, apertado e escuro. A gente sofreu muito, era uma sensação grande de abandono. Esqueceram a gente lá”, lamenta.
Para o vendedor de artesanato José Francisco da Costa, que possui seu ponto há 55 anos, a reinauguração é uma vitória. “Sou do tempo em que o rio ainda era limpo e que se vendia tracajás. A gente tem que agradecer este resgate do Mercado, que nos leva de volta àquela época”.
Atrações
O visitante que for ao mercado terá a oportunidade de conhecer um pouco da história de sua construção, por meio de banners explicativos e estruturas preservadas em sua forma original, sem restauro.
Por lá é possível saber, por exemplo, que a estrutura original, inaugurada em 15 de agosto de 1883, foi inspirada no mercado Grenelle, localizado na França, e que existem outras dois mercados similares no Brasil, um em Fortaleza e outro no Recife. Em um dos cartazes, está a imagem do projeto original, com a autorização de execução da obra, assinada pelo representante do “Escriptorio de Engenharia da Câmara Municipal da Província”, datado de 1881.
Outra curiosidade esclarecida na exposição refere-se a construção do pavilhão da Tartaruga e dos quioesques octagonais, que só foi incorporada à obra em 1.909 e teve que sofrer reparos após um bombardeio direcionado ao mercado em 1.910.
Os pavilhões da Carne e do Peixe foram construídos em 1.902, em substituição a “puxadinhos” improvisados em 1.890.
Há ainda um sino, conhecido como “Sino da Creolina”. De acordo com historiadores, ao final do dia o sino era tocado, para avisar aos comerciantes que a feira iria fechar. Para manter a segurança sanitária dos produtos, evitando que comerciantes vendessem no dia seguinte peixes e carnes estragados ao consumidor, o que ficasse sobre o balcão após o toque do sino era inutilizado com creolina.
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